sábado, 20 de abril de 2013

Elas é que a levam direita

Max de Castro - Samba Raro (Max de Castro)

Curvas, ondas, linhas reluzentes de brilho auto-bronzeador ou contro-bronzeador ou hidratante all day long. Meneios, folhos de saias, ou semi-saias sem sombras na calçada, "panturrilhas" (amorável vocábulo!) cheias de tónus e verve, cinturas impressionistas mas em magreza surrealista e cabelos curto-convincentes, ou imensamente esvoaçantes, ondulados ou liso-índigeno-sensual-escorrido. Olhos apressados, pés lânguidos, braços esbeltos e flancos ágeis. Bustos lentos, pela rua. Olores indecifráveis, que podem vir delas ou dos folhos ebúrneos de Primaveras cândidas.
 
Eis, supra, o quadro que arranca comentários ladinos, do trolha ao homem de negócios, do malandro perspicaz ao insosso distraído. A juventude, em geral, a firmeza carnal e as formas definidas emaranham devaneios e soltam a lírica frustre dos pobres a arder em deslumbre e falta de dicionário para descrever a fruição aos quatro ventos.
 
Claro que entendo estas fadigas. Qualquer um que esteta seja tem de compreender os rigores e as perturbadoras consequências da beleza e da energia magnética da juventude espaventosa.
 
Aproveito, contudo, para dar humildemente conta do que acicata a minha mirada contemplativa e invejosa, todo o meu despeito oblíquo, em boa verdade o meu olho gordo. Quem não sente não é filho de boa gente, n'est-ce pas?
 
Acontece quando as vejo, em pequenos passos de pomba, pelas ruas claras do bairro. Aprecatam-se, confortáveis e ledas e leves, a condizer com o dia soalheiro. As bolsas possuem todo o aparato necessário à sua beauty e às necessidades comezinhas do dia-a-dia. Porque cada dia é um dia. E, sei lá, se o dia. Sabem perfeitamente onde vão, subtilmente voluptuosas e apenas aparentemente não frenéticas. Voejam por todo o lado, enquanto os seus cabelos azuis, lilases, luminosos, mixed colours, arrastam consigo feixes de luz e apurada paz. O tempo por sua conta, os gestos sem a programação contínua das obrigações. As conversas duram segundos, ou horas, indiscriminadamente, numa liberalidade cool e everything friendly.
 
E depois, quando enfim se cansam do frio, ou do calor, ou do convívio com as gentes, recolhem ao inenarrável aconchego das suas moradas, ao desmedido prazer do choco. Leem, veem televisão, pintam, conversam com o preguiçoso, delicioso vagar. Dançam com as memórias no alto do seu Olimpo. Dormem soninhos de beleza, tomam chazinhos de cores fortes, onde molham biscoitinhos de outras eras, vestem indumentárias caseiras, floridas, leves, armaduras indefetíveis da sua beatífica onda. Numinosas gaiteiras. Azougadas, elegantes, luminosas, bem-falantes, argutas, amistosas e sorrateiras bailarinas diáfanas andantes. Mas muito reais.
 
São as velhas do meu encantamento, da minha paixão. E repetir não me cansa: elas é que a levam direita, as velhas. Chiques e plenas e leves e sãs. Elas é que a levam direita, e podem fazer o que lhes dá na veneta. Elas é que sabem da coisa. Super fã.

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