quinta-feira, 2 de abril de 2015

O Mestre

Manoel
 
Às vezes é verdade que a Alegoria vira um pouco a secção necrológica. Normalmente de seres que, pela obra, são meus amados.
 
Todos sabíamos que ouviríamos esta notícia mais cedo ou mais tarde, mas eu pensava sempre "mais tarde, muito mais, por favor." Assim com Niemeyer, e agora com Manoel de Oliveira, que morre aos 106 anos, no seu e meu amado Porto.
 
Não é verdade que se louvam apenas os que vão, não eu pelo menos. A minha relação com um dos maiores realizadores do mundo de sempre nasceu de forma tão espontânea que nunca poderá atribuir-se a modismo ou mania. Estava no cinema para ver outro filme, de que não me recordo, e anunciaram o trailer de O Convento. Fiquei fascinada. Uns dias depois vi o filme, ainda hoje o meu preferido dos que vi, faltam-me muitos felizmente, e Manoel de Oliveira passou a ser o realizador-escritor que eu amava, e que mal fazia um filme eu sabia que tinha de ir ver. A sensação era, e continua, a de distensão no divã, de intimidade com o momento e com a mundiviência manoelina. Mudou a minha perspetiva da filmagem, a minha forma de ver cinema e levou-me a amar uma arte que via com alguma desconfiança pela pouca satisfação que me trazia.
 
Claro que foram importantíssimos os atores de que se rodeou, a matriz de Agustina, mas ele dava o todo e o sopro de vida a tudo isso, a tudo aquilo que depois pairava na imaginação de quem teve a sorte de lhe prestar atenção.
 
Um filme por ano até ao fim, um portento. Porém, trata-se esse facto de um grande extra. Tivesse Manoel de Oliveira feito apenas um, ou dois, ou três filmes, e seria igualmente imarcescível.
 
E não só o País, mas todos os pluriversos devem estar de luto, agitem-se lágrimas de Saturno.
 
E eu amo-o.

2 comentários:

Imperatriz Sissi disse...

É uma pena...de algum modo sabíamos que ele estava sempre por perto, a trabalhar...mas foi uma vida cheia!

Tamborim Zim disse...

É verdade! E deixa-nos pistas de si e do mundo nos filmes, no tempo q tentava deter.