terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Gravidade

Tempo Slow (R. Kelly)
 
 

Gravity
 
Sempre achei que o filme Gravity devia ser chatérrimo. Talvez não tenha bem retido que o realizador é o Alfonso Cuarón, de quem sou fã pelo E a Tua Mãe Também, mas cujo Grandes Esperanças achei um pincel. Mas ele tem qualquer coisa.
 
Noutro dia alguém dizia que não gostava muito do R. Kelly. Eu logo afirmei ser muito fã. Tenho pensado muito neste super R&B performer, porque é um caso bicudo de apreciação. Pela antecedência criminal formal, foi absolvido de todas as acusações que lhe haviam sido dirigidas, e algumas delas bem escabrosas. Por outro lado, o que é que interessa o lado humano do artista, que importam os progenitores da arte? Não é ela, em si mesma, depois de emanar dos neurónios, das bocas, das cordas vocais, das horas laboriosas de papel e arranjos, no caso da música, um continente distinto de um ser humano com tremeliques, músculos e unhas? Não conquista o imaterial artístico uma segura independência do seu criador? Não se alforria, algodónicos, a criatura? Prefiro pensar que sim. Isto porque considero o R. Kelly um primoroso compositor, continuo a descobrir as suas produções e não paro de estacar. A crueza da lírica não consegue apagar, e muitas vezes enfatiza, o poder da melodia cinéfila e intensíssima de Kelly. Quem lê este rol singelo de anotações e queixumes que é o meu blog bem sabe que nunca música alguma superará, para mim, o fascínio, a enormidade, o gigantismo da MPB. Mas também por isso fico encantada quando conheço "novidades", ainda que carregadas de décadas.
 
Recentemente passou na televisão o filme Gravity. Estava a precisar de relaxamento quase total e aquelas imagens da magnífica Bullock a errar na negritude azul do Espaço convenceram-me. Pus a TV no mute. E a banda sonora da maior parte do filme, que vi, foi a formidável canção que deixo acima, Tempo Slow. Parecia um casamento estelar de ambiências. "Andamento lento/luzes baixas/deixa-me levar-te a um lugar/Onde só o amor se goza/Vem para o meu território/E deixa a vibração começar" (tradução minha, liberal e libertina).
 
A Bullock pelo Espaço num lugar azul e preto, a Terra abaixo, azul, a errância de todas as vidas.
 
E eu ali, na noite, no escuro da casa-cinema, com esses dois cenários fundidos mais a paz da gata Paloma, eu a DJ dessa improbabilidade surreal.
 
Tenho de dizer que amei.
 
Céus, como gostava de errar pelo Espaço e voltar!


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