quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Lobotomix

Certamente que não se trata de nenhuma tentativa (falhada!) de emular aqui um Kaddish, longo poema de um dos poetas mais "meus", Allen Ginsberg. Não, nada que se pareça. Só que esta sensação, esta sensação, almas generosas, é estranha. Antes talvez isso quisesse dizer parto poetastro. Estou parada, são mais que horas de dormir, e o meu coração bate, bate, em total desproporção. A cabeça parece que foi escavacada e que ficou sem uma parede, os ouvidos vez ou outra fecham-se. Aquecedores e ares condicionados? Se o peito não batesse tanto, até ficar dorido... Por que é que o coração invade a traqueia e pretende pular, não conseguirei, por artes absolutamente naturais, sentir-me bem e sem dores e desconforto? A única coisa sequente é o desalinho, a fímbria perigosa do "tudo pode acontecer" encrespa-se e ali fica, congelada e superior num horizonte desfocado, só ela real, apenas ela a reunir nitidez.

De poeta e de louco...pois. Eis os ouvidos a intercomunicarem-se na confusão, e pam, pam, pam, pam, pam...Não sabe o lado esquerdo que a esta hora a lei do ruído vigora, plenipotenciária e severa (sic)?

Penso nas luzes do céu frio e tão puro do campo, um céu de tomar banho e de reescrever a vida com as estrelas nos olhos. Esta imundície só pode atrofiar-nos os membros e degenerar-nos a musculatura da regeneração. Pam, pam, pam, pam.

Falo para um mudo, o meu peito não me ouve, assiste-lhe a verborreia ignara dos que não querem saber de nada - "motor imóvel"? Dói-me. Que fazer, dói-me. Um comprimido, dói-me, chaise-longue, dói-me, um bilhete para alhures, dói-me, a circum-navegação lunar, dói-me, o ouvido direito, pulsa, a cabeça, alastra, a náusea, insinua-se-me pacóvia sem graça, o coração, pum, pam, pum, as minhas mãos, dói-me, o teclado, dói-me, o écran, dói-me, este estar, dói-me, dissolução, dói-me, aquela tarde, dói-me, o esquecimento, dói-me, este mal-estar, dói-me, este pesar, dói-me, a impureza, dói-me, o enferrujado esqueleto em que me transporto e onde vou sucumbir e sucumbo, apaixonada nas eternas vésperas da minha deflagração, dói-me, este cansaço, dói-me, esta exaustão, dói-me, dói-me, dói-me, dói-me, dói-me. Dói-me e explode-se-me como se sofresse ataques cardíacos sucessivos de mil corações desprogramados.

Dói-me a falta de talento, talvez a minha, provavelmente a minha. Só pode ser a minha. Faz-me contusões.

O pescoço, dói-me, as horas a menstruarem todos os relógios do mundo, do mundo que me dói, vagabundo, dói, vagabundo, dói!

Só queria uma vaga abundante, impoluta e incolor, que me fosse limonada, narciso, sono, solto, sem sonho. Indolor.

Que inaturável chorrilho! Doloroso sudário de letras que, adivinhem:

dói.

Apoiado?

- Ihihihh, vamos brincar com a Zim!...

Noutro dia numa conversa genuinamente simpática sobre estilos, diz-me uma menina  que gostava do meu, que considerava bastante diferente do seu. E depois acrescentou que achava ser eu uma daquelas pessoas "que mesmo com uma poia em cima da cabeça fica bem". Rimos e fiquei com uma espécie de ambivalência, mas depressa percebi que era mesmo um elogio. Que dá sorte e tal, hum!

Diacho, mas não é que já me imagino com a poia? Talvez a condizer com os collants. Imaginosa...

Facto, camaradas

O povo é quem mais ordenha.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Luxo por todos os poros

Le Mépris - Jean-Luc Godard (1963)

E por falar em cinema, aliás, em cinema enquanto arte, ou melhor, em cinema enquanto arte que nos arrebata, deixo por aqui o mítico início de um dos meus filmes preferidos - Desprezo, de Godard. Espampanante Godard, soberbos Bardot e Piccoli, incomparável Casa Malaparte, outra personagem da trama, e a banda sonora luxuosa e impressionante do Georges Delerue. Noutro dia trouxe-a para casa, e é emocionante ouvir o disco porque, mesmo sozinho, não se descola do espírito do filme, parece a Camille (Bardot) entrar-nos pela sala, numa insolência arrebitada, a exigir a nossa exclusiva atenção. A música é também, para além da casa, outra personagem não humana. Não humana, a música? Hum, suponho que isto não seja rigorosamente verdade.

Pode ser o filme mais "popular" do Godard, não sei. Até agora, é o meu preferido das suas aventuras. Naquele lapso de nada em que parece coisa alguma de importante, marcante ou definitiva poder acontecer e quando, ao invés disso, tudo acontece, lá se abre espaço ao desfile do grande Drama, da curva da tragédia, da inelutável metamorfose, ah! Não só por isso mas também por isso amo, amo, amo este filme "totalement, tendrement, tragiquement".


domingo, 26 de fevereiro de 2012

Sobre os Óscares

Professor Marcelo Rebelo de Sousa, sobre O Artista e A Invenção de Hugo (não vi nenhum): "Não, gosto dos dois, um é francês, ainda que mudo, e um francês mesmo mudo ganhar à América é sempre uma coisa complicada." (Citação do que recordo da frase de há uns segundos.)

Hilariante!

Sou bem mais entusiasta do cinema europeu (o Brasil tem coisas sublimes também nas suas produções contemporâneas), por ser mais reflexivo, mais poético, mais nutritivo. No entanto, ele há clássicos, nomeadamente musicais, que me encantam nos States. E o Woody Allen é dos States. Não, na verdade é meta-galático.

Que vivam as belas histórias, e que sejam bem contadas.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Bom dia

Morning Sun - Edward Hopper

Bom dia
a madrugada fria
dissolveu-se

(longe arderá o poente outra vez)

frutado o sol propicia
ao velar, ao vê-la somente,
o desmanchado azul na margem esguia

a vastidão do corpo em basta luz
na timidez mal orquestrada da expansão do som
altera singularmente os ângulos da casa

(onde arderá o poente outra vez?)

o soalho iluminado nos meus pés vagarosos
quando foi ontem, outrora, já?

esta claridade cega
a cronometria

dia
bom.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Do mar

Chorei. Chorei do fundo, de dentro, de trás e da frente, inculpe, imensa. Chorei-me a mim, a tudo, chorei amor e ódio e repúdio, chorei para quem quisesse ver. Chorei em mágoa, chorei em água, em fogo em sal, em fel, em violência incontida. Chorei sofrida, sentidamente. Chorei estrepitosamente, em chaga, em ferida, chorei o Inverno e todas as Estações do porvir. Chorei devir, chorei devagar, ruinosa, precípite, tresloucadamente e ávida. Chorei a vida. Chorei a morte das coisas estimáveis. Chorei e chorei e chorei. Eu mesma, eu mesma toda, eu mesma cheia de dor, chorei. Chorei e dei-me, e dei, chorei, falei, chorei sem beber uma lágrima. Chorei sem aguentar, chorei sem soçobrar, chorei resolvida. Chorei a dar a cara, chorei quando chorar fala mais alto do que a palavra que me sai. Chorei a jorrar. E sempre que tiver de ser, assim chorarei.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A irresistível presença da claridade

Tudo luz

Camaradas queridíssimos, isto por hoje é muito simples. Ou se tem cara, ou c...ostas. Ou se tem a certeza do que se pensa, ou se é, ou está, perturbado. Ou se tem perfeita consciência do que se diz, ou se é, ou está...perturbado II. Ou se sabe o que se quer e se coloca isso sobre comodidades, facilitismos, confortos e necessidades, ou se ignora. Ou se enfrenta as crises apesar de tudo, contudo, e com tudo, ou se foge, pela imobilidade ou pelo esconde-esconde. Ou se sabe, ou se imagina. Ou se fecha os olhos, ou se esquadrinha. Ou se é franco, ou se aporrinha. Ou se é forte, ou se é fraco. Ou se é honesto, ou se é mau caráter. Ou se é corajoso, ou se é covarde.

Há alturas muito precisas da nossa existência em que todas estas características e estes adjetivos têm de ser transparentes, puríssimos à nossa perceção. É toda a diferença entre perder ou ganhar. Ou se sabe isto, camaradas diletos, ou não.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Assino em baixo

"O que mais me preocupa não é o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que mais me preocupa é o silêncio dos bons."

Martin Luther King

Estou com ele e não abro.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Oceano

Paula Morelenbaum, Ryuichi Sakamoto e Jacques Morelenbaum - Sayonara

Querido Carlos, diga-me que aí nesse sítio tem acesso à Internet. Já sei que diria "Nem pense nisso!", ainda com direito a mandar-me bugiar. Entendo perfeitamente. Não foi só hoje que me lembrei de si. Na verdade, lembro-me as vezes suficientes, ainda noutro dia me ocorreu a sua metáfora de "um gole de vinho bom" para as boas coisas passadas. Reconfortante, não nego, e veraz. Quando o é, claro.

Sabe, fico contente por lhe ter apresentado a voz sem descrição da Paula Morelenbaum, de que tanto gostou. Ela merece ser amada. Essa canção aí de cima nem sei de quem é (mas ouço o Tom por todos os lados e requebros da melodia...), só sei que é linda e que pode bem acompanhar esta minha improvável missiva, que talvez muitos olhos vão ler excepto, diria, os seus. Saudades, amigo, até de me amofinar e ralhar para me "interessar por alguma coisa". Sei que sabe o quanto isso é difícil, este mundo é tão desinteressante demasiadas vezes, mesmo sendo o Caetano a dizer que "O Mundo Não é Chato", num seu livro por acaso (ou não por acaso, certo), maravilhoso. A coisa é realmente entontecedora já que é tão fácil que as gentes que  muito sentem se interessem. Depois, claro está, vem tudo o resto, e para essas gentes pode incluir torrentes diluvianas de deceção e miséria. Perdoe, mas já usamos o Acordo Ortográfico. Sim, é aborrecido. Mesmo com a nossa mútua mais que simpatia pelo Brasil. Lembra-se quando a Dora F.S. partiu? Disse-me, numa boa ironia que me aliviou um pouco no contexto, que "Veja lá, as pessoas têm esta coisa de morrer!", ou algo parecido. Digo-lhe o mesmo hein, camarada? (Deve detestar o termo, ou talvez não.)

Estava a precisar de um dos seus abanões e ralhetes, talvez que me distraísse com a minudente mostra da sua coleção de cachimbos. O mundo não nos deve felicidade, não era o que dizia? Sei que cada um de nós tem em si alguma coisa de tão significativa e incomportável que, isso sim, nos faz dever e tomar ao mundo, ao mundo que somos nós e os outros. Apenas, há durezas e tristezas e buracos negros que nos sorvem os ensaios de regeneração que por vezes levam uma vida a conseguir; um simples esquisso, uma eternidade Carlos, sei que percebe, então não! Enfrentar o despovoamento é recomeçar a intentona. Em que caravela, nau, não sei. Só sei que agora já não posso conversar consigo, bom amigo, que não vai poder dizer palavra a esta carta, nem a nenhuma outra que possa vir a mandar. E é por essa impossibilidade que ainda não quero ir. Porque há um imenso possível que não está longe, mas pertíssimo. É o passo, o trejeito para lá chegar que se faz himalaico, everestiano, transgalático, quase inexprimível. Para isso é precisa a viagem, necessário o sentido, o apaziguamento das dores e dos fados, o além deste cansaço. Imperativo: sobreviver. Não sabia que era assim. E quem o saberia?

Talvez achasse graça a esta Alegoria, ainda que possivelmente a considerasse demasiado cheia de ameninades. Mas sei que riria, vez ou outra, com as minhas disparatadas perplexidades.

Saudades e afeto, para sempre.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Passeio com Su Dongpo

Leitor leitor, não termine o sétimo dia sem cumprimentar Su Dongpo, poeta chinês de há dez séculos. Aí está ele a passear no rio da barrinha lateral. Na co-criação dos imaginários, somos eternos coevos.

Les Magnifiques Aventures de Tamborim Zim

A Doida, Seu Jorge * (Seu Jorge/ Pretinho da Serrinha / Leandro Fab)

Mademoiselle Zim, que de tão pouca bagagem exclusivamente de mão tanta consegue desdobrar entre casacão, cachecol-mantilha-manta-cobertor, mochila atafulhada de coisas e as mãozinhas com telemóvel, cartão de embarque (ce) e Cartão do Cidadão (CC - enquanto a cidadania for superior ao Embarque por lhe merecer inicial maiúscula não pode o Cosmos avançar nem os homens civilizar-se!), preparava-se para o controlo de bagagens. Almejava eu o belo do free-shop, pois queria comprar chocolates (pretos, é claro, sem leite). Beberiquei a água à pressa e deitei a garrafa fora, que é sempre aborrecido fazermos aquela cara murcha quando os controladores se abarbatam à garrafa eles próprios e no-la tiram - isto apesar de sabermos muito bem que não temos o direito de levá-la, e que nem deveríamos fazer as pessoas perder tempo com as nossas distrações. Pergunta-me o senhor se tinha líquidos, sosseguei-o que não. Viu o CC e cumprimentou, numa toadinha brazuca: "Tudo bem?". Eu que sim, obrigada. "Brasileiro?" Creio que disse que era. Depois concluiu uma coisa que me pareceu: "Há aqui águas." Eu: "Águas?!" Depois de uns segundos de desentendimento, lá me explicou: "Botas". Hum...diacho. Sim, levava botas e já me tinha livrado na Portelinha da seca de as tirar, ah, mais pas a Orly! "Quer que tire?" Que sim. Fico imediatamente com aquela vergonha estúpida que se me abate nestas situações. Ao constrangimento e baralhação das alpercatazinhas em papel que o senhor me deu, o que me fez ainda mais triste quando me vi e senti com as ditas nos pés,  juntou-se o incomodatício facto de já ter não sei quantas coisas nas mãos, o que me fez colocar CC e ce em cima da cobertura do tapete rolante. Lá dei adeuses e mais bonjours e fui recolher os meus pertences em miríades de tabuleiros. Estas botas têm um problema em ambos os fechos que, dependendo da sorte, do engenho e do stress, consigo resolver mais depressa ou mais devagar. O primeiro....zzzzzip, zás, ok. Dei graças. O segundo...cof cof...Já toda dobrada, irritada e a ofegar, desisti de tentar fechar a bota sob pena de provocar um engarrafamento. Peguei em tudo e ia sentar-me numa cadeirinha para proceder em conformidade. Hum...onde é que está o ce?? Com mil brecas! Voltei atrás e lá arranquei o papel que estava tranquilamente onde o deixara. Sentei-me e comecei por tentar fechar a bota. Apre bolas!! E o CC??? Um senhor sentado ali por perto falava ao telefone em espanhol, ora bem, um nuestro hermano. Fiz-lhe o gesto universal de perguntar se ele me dava um olhinho, ou des petits yeux, ou una "miradia" às coisas, ao que ele simpaticamente assentiu, e eis-me de botilde aberta a caminhar para o controlo. Fiz uma cara de aflição inquiridora ao meu amigo controlador, que me mostrou, com segurança confiante, um cartãozinho que tirou de cima do balcão. Ai, saravá, saravá. Sorrisinhos com os senhores, torcendo para que me não detivessem, volto para o meu lugar. Agradeci ao espanhol com uma mistura de namasté e alívio, ele ok com o polegar, ainda ao telefone, tudo fixe. Mais uma vez me contorci toda por cima da bota, a ferver e morta por me ver noutro cenário e ir morder chocolates (darks meu povo, darks). O fecho não cedia e eu pensava na cara de mico que ostentaria caso o gentil senhor terminasse o telefonema e se visse, ele próprio, forçado a tentar ajudar-me com o fecho da botinha chamejante escarlate com interior "cor-de-laranja-saiam-da-frente-estilo-é-meu-nome". Reuni a força, a minúcia, a perseverança e... eh bien, resultou! Fechou-se a sapata.

Peguei nas trouxas todas e dirigi-me à casa-de-banho. De caminho ouço "Madame, Madame!" e pensei, aborrecida, no que me quereriam. Era um senhor que prestavelmente me entregava o "cachecol-mantilha-manta-cobertor", que por certo jazia no chão quando, com a casa às costas, me preparava para o perder. Muitos merci biens e tal e chose e lá me enfiei na casinha. Perder mais um acessório depois de ter ficado sem o meu gracioso gorrinho nos andanças parisienses seria, como direi...trop. Muito do trop!


P.S. - Na verdade a confusão faz-me pensar se a ordem dos acontecimentos foi exatamente esta mas...foi muito próxima, afianço.

* Tão bonitinho não é? Amo.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Gris bisous

Sena sparkling

O frio do rio

(fotos de Zim)

Dança da Chuva Já

Daniela Mercury e Samuel Rosa - Minas com Bahia  (Chico Amaral)
 
Para já, há que confessar o meu espanto e transe: fui ali verificar a data do disco Feijão com Arroz, da Daniela Mercury, e lá apanhei com outro arrombar do Cronos por mim adentro: 2006. 16 anos! Eu e os meus 19 e a ginga de Madame Mercury, poderosa e substantiva e enérgica, linda, inquestionavelmente importante nas duas últimas décadas da MPB. Daniela Mercury nada tem a ver com cantoras mais popularescas e de ritmo fácil fácil. Olhe-se para a discografia, escutem-se as faixas dos CDs, atestem-se as parcerias e afiram-se os compositores que canta, e as músicas que também faz, e percebe-se o que quero dizer. Sou fã confessa do seu talento e da sua "alegria ocidental".

Não fui eu propriamente que fui buscar esta canção, hoje, foi a dita que cantou dentro da minha cabeça e me escolheu. Por isso aí está ela, supra e radiosa, contando adicionalmente com a voz linda do Samuel Rosa, por sua vez vocalista de um grupo que eu amo, Skank. Além de que, amáveis, além de que...dá-me umas saudades de Salvadô!... "Amanhã é domingo menina, ninguém vai te acordar!" Muito axé.

Somos eternos saudosos do riso, e mais ainda da Alegria. Trans-carnavalesca, leia-se.

Este azul está um primor mas é preciso chuva; que se sinta chamada pelos tambores.

Notícia blogosférica

Um blog intenso, com alguma coisa grande lá dentro e cujo último post me emocionou. E com outro chorei a rir. Recomendo, e há mais de onde este veio: dáAli . Vão gostar.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Sensualidade e Bom Senso da Grande Idade

A Mãe - Dir. de Roger Michell (2003)

A pele e o amor e muito tempo

Pure charming
Beijar é renascer
Novo antigo
Classe é posto
Old Man Thinking - Leonardo Da Vinci
A Old Woman Reading - Rembrandt
Woman with a lantern - Marianne von Werefkin

Gostamos de História, dos mistérios recuados da Arte, amamos viajar e ganhar espaço, perspetiva e profundidade. Somos irremediavelmente atraídos pelo requinte, pela serenidade forte e pela ternura, emociona-nos a delicadeza. Apreciamos genuinamente a amabilidade do gesto e da palavra, a demorada maturidade da forma sábia de ver o mundo e as pessoas. Prezamos as atitudes respeitosas, encantadoras, deleita-nos e aquece-nos o peito uma meninice que não deixa de ser formosa em idades não meninas. Somos irreversivelmente seduzidos pela familiaridade dos sorrisos, pelo apelo a alguma proteção tão cheio de graça.

Por que razão, perante todos os atributos mencionados e o ingente caudal de informação cumulativa de que hoje dispomos, e que tanto contribui para alterar mentalidades, prioridades, até sentimentos e razões, por que razão leitores estimados, são os idosos esquecidos? Maltratados? Desconsiderados? Preteridos? Desrespeitados? Não amados como deviam, sem usufruirem da reverência que lhes é devida pelo simples facto de terem sobrevivido mais tempo às coisas tão difíceis da existência, criado famílias, contribuído com esforço, empenho e tenacidade para um mundo que os olha de lado, ou ignora, ou não vê o encanto das suas rugas, marcas, da lentidão imersa em tempo, experiência e saudade do seu caminhar, da doçura infinita dos seus olhos vivos? A fragilidade que a depauperação da saúde e todo o complicadíssimo processo de envelhecimento comportam seria, por si só, um motivo gigante, tremendo, gritante, para os defendermos e mimarmos e estimarmos com carinhos diários, numa poesia constante e gratidão por beneficiarmos da sua presença, da sua atenção e do seu tempo que, a cada dia, se torna mais e mais raro.

Somos tão ávidos de nós, de todos os nossos minutos e segundos, de um dia-a-dia esfomeado, tão ávidos de vento afinal! Atirados ao chão, ao solo seco de afetos estriados, sem água, sem viço e sem flor, porquanto não regados com todas as fabulosas possibilidades da nossa juventude, da nossa saúde, do nosso alento.

Não me entendam mal. Não santifico nem diabolizo estados etários. Mas digo o que sinto. E o que sinto não toca apenas, nesta dimensão, aos que chamamos de nossos. Toca à vizinha, ao senhor com quem nos cruzamos na rua, no trabalho, aos casais de há décadas no supermercado, aos que dormem num beco qualquer escuro e frio, aos que habitam solidões, mesmo com teto, aos tristemente desalojados dos corações dos outros, e tantas vezes dos outros que continuam a chamar de seus.

Novidade: os idosos, esses seres dignos e encantadoramente vetustos, e que amam quando sorrimos para eles, são homens e mulheres. Têm ideias, corações a palpitar, sonhos, desejos, sexualidade, necessidade de conforto e beijinhos e atenção e humanidade como, adivinhem, cada um de nós. São dotados de uma força ilimitada quando se trata de ajudar e proteger os que amam, tornam-se ainda mais imensos, quase sobrenaturais. Enfeita-os uma beleza que o seu pleno desabrochar não apagou, mas modificou. Possuem outros corpos, outras peles, outras estruturas ósseas. Mas quantos romances sem preço se escreveram na avançada idade, quantos poemas, descobertas, ensinamentos, filmes, composições musicais, filosofias e mundividências se erigiram com a clarividência, a perspicácia, a sensibilidade do poder dos anos! Quanta riqueza.

Um idoso é um tesouro. Como eu, como usted. Foi, continuará a ser, como nós seremos. Irrepetíveis, fugazes e merecedores da maravilha. Vamos ser amor. Por favor. Dignos do sublime.

Não chorem mais leitores meus!

Diletos, magníficos, compreensivos, saudosos, desesperados, abandonados leitores...voltei! Não posso largar-vos tanto tempo. Pois não. Mas o próximo post vai merecer a Vossa querida fidelidade.

Abracinhos.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Alucinações hiemais

Agora mesmo lembrei-me do som incessante dos grilos, no campo. Ouvir-se-ão menos, com este frio?

Os homens inimigos, as mulheres que não se gostam e se entreolham, separam-se. Todos têm frio.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Receitinha de Zim


Soja à la Zim

No final do ano passado fiz o meu primeiro refogado. Vero. A mudança feliz para uma dieta vegan implicou o início das minhas façanhas culinárias, o que diversificou as possibilidades e as aventuras de sabor que me permito. Gosto da preparação dos alimentos, de hidratar a soja, de preparar a salada, de observar a facilidade higiénica, saborosa, estética e tranquila com que se podem cozinhar tantas coisas que não provocaram quaisquer danos a seres sencientes. Isso intensifica o deleite e o amor por esta nova fatia da minha vida. Por outro lado, vibro com o empratamento.

A receita de hoje: soja sobre refogado com sal marinho, pitadas generosas de caril, açafrão, pimenta branca e noz-moscada. Tudo devidamente banhado com natas de soja e acompanhado de feijões vermelhos, esturgindo alegremente na frigideira. Perímetro de segurança: musgo da Irlanda e tomate mini chucha. No topo batatas fritas solenes e, ao redor...miolo de amêndoa granulada. Acompanhamento? Uma reconfortante bebida de espelta quente.

Go vegan. Taste your ethics.

É particular

Infinito Particular (Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Carlinhos Brown)

Os dois discos editados por Marisa Monte em 2006, Infinito Particular e Universo ao Meu Redor, com a classe do selo Phonomotor, são perfeitamente exemplares do diamantino talento da Diva, da felicidade das suas parcerias e do indefetível apuro estético que fideliza para sempre.

No meio dos meus afazeres em catadupa deste fim-de-semana, ouvir Infinito Particular é um bálsamo.

Só aqui entre nós, fica a faixa que escolhi. Uma verdadeira Faixa de Gaze, mas  plena de Gás.

Princípios € valores

A Alegoria da Primaverve recebeu, pela primeiríssima vez na sua ainda pequena história, um modesto convite publicitário, como de resto tantos outros blogs.

A verdade, meus bons leitores, é que as contrapartidas eram desinteressantes. E nesse caso, sendo os valores diminutos, bom...tenho os meus princípios!

Meu nome não é Venal, hein?

Guerra e qual paz qual quê

Talvez cessassem as guerras, os crimes passionais, o homicídio entediado, o genocídio geral, na justa proporção da expansão dos desabafos.

Desabafar é uma arte e abafar, demasiadas vezes, um crime. Bélico.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Do pão para a boca

As Ceifeiras - Soares dos Reis

Na falta de uma gigantesca fogueira que nos trague o frio do camandro, preciso urgentemente do calor que chega nestes gestos das ceifeiras, do sol do trigo, da paz pascente da vasta paisagem aurífera. Enorme, imperdível, quase tangível, hiper tangível tela-momento.

E pelo Museu Soares dos Reis, na claridade rara do meu amado Porto, que horas deliciosas se fruem! É quando o tempo não se mata, mas multiplica. Pão para a boca ávida do cuore.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Dark Drank Disc

Music
(Foto de Zim)

Relaxe leitor, entregue tudo nos "dedos róseos da aurora", como dizia o Homero. Dê a sua participação por terminada nesta bizarria por hoje, aqui na orla da madruga.

Ouça música no escuro. Ligue a sua máxima atenção, escute o Gil, o Sean Paul, a Maria Creuza, o Caetano, o Dori Caymmi, a Julia Fordham, a Marisa Monte, o Ben Harper. Take your time, leitor, que o vento é certo e a finitude diz que adormece quando o delírio artístico e a ânsia infinita que o contém acordam. Ajuste o volume.

Ou inspire profundamente, expire ainda mais e ponha o silêncio no máximo. Deixe-o explodir.

Que diz?

Perguntinha mui simples

Alguém viu uma seta a indicar: Afetos Não Exasperantes?

Zzzzzzocorroooo


- Zim avoa avoa avoa Zzzzzzimmmmm!...

Quem sou eu para contrariar as grandes forças da Natureza? Ninguém, eh bien. Mas julgo ser imperativo planetário enviar esta humilde mensagem ao senhor vento.

Dileto e intempestivo Vento,

Sei que andais em desvario incessante, talvez derivado à crise, quiçá, em dança aterradora e poética, com os Vossos pés mágicos em derredor do Mundo. Arrancais telhados, copas de árvores, ramagens, ceroulas, tudo enfim. Encheis de folhas as ruas, ameaçais perigosamente a integridade das antenas e, por conseguinte, a ligação ao imperdível universo televisivo de milhões de lares. Atravancais as ruas de lixo, fazeis milhões de incontáveis ciscos invadirem olhos e orquestrais miríades de portas que sonoramente barafustam sob o Vosso orgulhoso ímpeto. E como se tudo isto não bastasse Vento, senhor, acabais-me com os Diclofenacs desta vida! Toda eu sou analgésicos, porque me fazeis das costas uma dor só. Clemência, clemência, em gentil brisa vos transmuteis, em gentil brisa vos transmuteis!

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Vamos cantar as Fevereiras

"Amo ser deslumbrada."

Curioso, surpreendente, inesperado, caricato?

                                                           Ridículo, risível, satírico, picaresco?

                               Antagónico, atordoante, inusitado, desconexo?

                                                                                 Seráfico, ambivalente, disparatado, vil?

Que dizer quando nos tentam aplacar, domesticar, anular as razões com migalhas mal amanhadas e mal atiradas depois de muita asneira?

Triste. Escolho este.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Medina nos Olhos

Medina Carreira

Já é por Vós conhecido, perspicazes leitores, o meu fascínio pelas tiradas magistrais do sagaz Medina Carreira, e do confronto do seu olhar de viés, semicerrado e acutilante, com os belos olhos inquiridores e espantadiços de Judite de Sousa, com a qual também simpatizo bastante.

Noutro bem-aventurado zapping de hoje lá o encontrei, inabalável. "Mas ó Judite isso são palavras, isto é conversa!". "Isto não é cá essas coisinhas de novos, nem velhos, é pôr o social na economia!" Lá indaga a boa Judite se os idosos não têm direito à sua expetativa de uma vida sossegada no fim da vida. "Têm mas não vão ter!", e tudo assim. Rematava Judite o programa querendo saber o que achava Carreira da polémica da tolerância de ponto no Carnaval, a qual não terá lugar este ano. "Ó Judite, você gosta de brincar, você tem cada uma!", enquanto já prendia os catrapázios das suas notas e gráficos pertinazes com uma bem-comportada mola preta. "Acho bem, claro que o Governo faz bem: numa altura destas, um País pelintra, de mão estendida internacionalmente, a tremer que a Troika não nos aprove as medidas, o que é íamos fazer, atirar farinha e pedras uns aos outros?!"

Delicioso, soberbo, uma festa. Se há coisa que eu gosto nesta crise é das intervenções de Medina. Gamei, sou fã, ponto.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Portuguesas com Estilo - Top TZ

Um post da Pipoca Mais Doce sobre o que a mesma designa por It girls, expressão que tenho reparado andar muito em voga, pelo menos na blogosfera "fashion", despertou em mim uma aturada reflexão. A Pipoca apresenta as suas preferências sobre mulheres estilosas. Naturalmente que cada um tem as suas referências de estilo, classe e influência, mas a questão pôs-me a pensar.

Vi e revi mentalmente as figuras públicas femininas desta nossa formosa Pátria que pudessem, não encaixar nas It damas, mas no meu conceito de classe e estilo. Foi duro, foi digno de escavações paleolíticas e pós-futuristas. Certo, sei que dão dez euros pelos meus pensamentos. Pois é, pois é, mas...só tenho para ustedes cinco nomes. Leram bem. Cinco portuguesas conhecidas, assim chamadas figuras públicas, de diferentes gerações e áreas de atividade. E, já agora, com estilos bem demarcados entre si.

Refira-se, ainda, que beleza é uma coisa e carisma, estilo e classe são outra. Podem reunir-se ou não, e felizmente nos exemplos abaixo coexistem com uma combinação feliz e única para cada caso, como se preza. Porém, esta minha lista respeita ao estilo, ao carisma, ao charme, ao  quê de agradável, instigante e interessantemente estético que se desprende das figuras, objetiva e subjetivamente. Pronto, não desliguem sumariamente os vossos bichanos pcs com birra e mágoa por esta delonga. Aí está o meu top 5, sem ordem que não a da minha lembrança:

Guta Moura Guedes

Gabriela Canavilhas

Catarina Portas

Rita Red Shoes

Maria José Morgado

Transpiram charme e nadam em estilo. Ainda assim, o facto de não conseguir ultrapassar o número de 5 faz-me chegar a uma conclusão com muito alvitre: precisamos de maior número de encanto e sofisticação, figuras públicas femininas portuguesas!

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Nem com Dimicina

Quando o buraco negro cerebral sai pela boca

O disparate, a selvajaria, a bestialidade indómita. E os sujeitos de tudo isso, que se incluem nas vítimas ainda que mal o pressintam, não dão ouvidos ao que dizem nem escutam com o coração o peso e o significado do que dardejam. Riem.

Há muitas bombas atómicas e muitas atrocidades, diletos, a maior parte projeta-se a partir de duas fulgurâncias anatómicas de tal forma dotadas no seu potencial que bem poderiam favorecer manifestações tão diferentes, optando dessa forma pela elevação em elegante detrimento do espúrio detrito: o cérebro e a boca.

Quando a verborreia é diarreia...não há autoclismo que nos eclipse tanto mal.

Extremo


O sono do perfume


Repudiar a impassiblidade insalubre que assiste à desgraça como o coro às carpideiras.

Sentir a beleza endurecida e polpuda da rosa fechada dentro da nossa carcaça ambulante e entediada.

Pressentir augúrios excitados de viagens sublimes no azul dourado das tardes frias.

Redigir Poemas e Constituições consagrando todos os direitos da Primavera e dos verdadeiros demandantes ávidos de luz e de escuridão e dos seus interstícios barrocos e misteriosos.

Deixar os nervos desfazer-se em rendas de bilros-risos por entre trevas e gulosos amanhãs.

A minha inteligência é mediana, mas a minha sensibilidade é extrema.

Desejos particulares para Fevereiro

- Vem posar, Zim on top!...

Queridíssimos leitores, pois que hoje, uns minutos depois do dia de Iemanjá, deixo estes votinhos singelos mas muito frescos para um mesinho novo e muito frio, certamente:

- Energia - oh, oui, como faz falta!

- Paciência - zim...

- Leitura - sim.

-Calma estruturada - pois, não se trata de paralisar, mas de resistir, construir e compor com solidez, força e tranquilidade.

Pronto, e agora que já pensei e redigi sensatamente vou ver o America's Next Top Model. Ah ah, achavam que era programinha que não me passava pelas retinas? Pois enganam-se, até porque amo fotografar e auto-fotografar-me e há dicas muito interessantes, para além do entretenimento light, agradável e estético que proporciona.

"Wanna be on top?"

Se souberem quem ganha não me digam, sim, por obséquio.